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Artigo: estudo mostra como os não infectados também sofrem com o coronavírus – Roberto lent

Por: Roberto Lent

O que acontece quando você fica fechado em casa, fora do trabalho e das ruas, sem ver presencialmente sua família e seus amigos? Mesmo que seja por uma boa causa, é plausível supor que haja consequências sobre a sua saúde emocional.

O impacto da pandemia de Covid-19 sobre as pessoas não infectadas isoladas em casa foi tema de investigação de um grupo multidisciplinar de pesquisadores de Pequim, Harbin e Wuhan, estes últimos no epicentro da crise. Os recursos foram rapidamente disponibilizados por um projeto de Pesquisa Básica sobre a Epidemia da Covid-19, disponibilizado em tempo recorde para as universidades chinesas.

O estudo foi feito com 170 pessoas durante 14 dias de quarentena em janeiro de 2020, finalizado em fevereiro e enviado para publicação no início de março na revista Medical Science Monitor, que o revisou em tempo recorde e publicou online em 12 de março.

Tudo começa com o conceito de ‘capital social’. Nada a ver com dinheiro, diretamente. Trata-se de um conceito de difícil definição que os sociólogos usam para descrever o conjunto de recursos reais ou potenciais que incluem a confiança nos outros e nos governantes, o sentido de pertencimento à sociedade, e a participação comunitária, elementos capazes de gerar redes duradouras de reconhecimento mútuo e coesão. O capital social representa o nível de segurança que temos ao viver em sociedade. Claro, é baixo nas sociedades desiguais como a nossa. Como podemos exigir um “sentido de pertencimento” a quem vive em condições de extrema pobreza e injustiça social?

Bem, o capital social pode ser medido por meio de questionários padronizados, aplicados aos participantes. No grupo investigado, a maioria dos participantes esteve próxima a pacientes com pneumonia, outros foram expostos a ambientes contaminados e alguns eram suspeitos de infecção.

Os pesquisadores avaliaram a correlação do índice de capital social com indicadores de saúde emocional (ansiedade e estresse), e com uma medida fisiológica (a qualidade do sono), que influi diretamente na imunidade das pessoas.

A pergunta era: será que o isolamento social repercute na saúde emocional e acaba impactando a imunidade das pessoas? E será que esse possível efeito depende do capital social delas?

O estudo estatístico de correlação entre essas variáveis indicou associação direta do capital social com a ansiedade e o estresse, sendo estes diretamente correlacionados com a qualidade do sono.

Quer dizer: quanto menor a confiança dos participantes na sua rede de contatos sociais – dos governantes aos governados – maior o grau de ansiedade e estresse, e pior a qualidade do sono, permitindo supor um mais baixo nível de proteção imunitária contra o coronavírus.

Bem, o que podemos aprender com esse estudo?

Primeiro: a população precisa confiar em seus governantes, uma relação vertical. Ponto positivo para as nossas autoridades de saúde, ponto negativo para as omissas autoridades de ciência e tecnologia, ponto ainda mais negativo para o presidente que confunde a todos com as suas declarações estapafúrdias.

Segundo: a população precisa confiar na própria sociedade, em suas redes de apoio e comunicação, serviços e solidariedade, uma relação horizontal. Ponto positivo para o trabalho da mídia tradicional e mesmo da mídia informal (redes sociais), ponto negativo para a extrema desigualdade: como se manter em casa sem trabalho e sem dinheiro?

No Brasil, o sofrimento dos não infectados será maior. O capital social é certamente menor por aqui.

Texto de: Roberto Lent

Graduado em Medicina UFRJ;
Mestre em Ciências Biológicas UFRJ;
Dr. em Ciências Biológicas UFRJ;
Pesquisador do Instituto D´Or de Ensino e Pesquisa

 

Sensível Mente

Revista de opinião e entretenimento, sobre temas relacionados ao equilíbrio entre mente corpo e espiritualidade.

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